A CLT e a nova tecnologia: o dilema das horas extras para vendedores externos

Milhares de empresas monitoram rigidamente seus vendedores externos através de aplicativos de geolocalização, CRM com check-in de visitas, rotas traçadas, horários de reuniões presenciais, relatórios detalhados de cada parada, sendo tudo rastreável e controlado.

Mas quando o assunto é horas extras, a resposta padrão ainda é:

“É vendedor externo. Não tem controle de jornada.”

Essa contradição tem base legal no art. 62, I, da CLT, cuja redação atual foi incluída pela Lei nº 8.966/1994, prevendo que empregados em atividade externa "incompatível com a fixação de horário" estariam excluídos das regras de controle de jornada.

À época, a justificativa fazia algum sentido: não havia tecnologia capaz de monitorar a rotina externa com precisão. Veja que o primeiro celular foi vendido no Brasil em 1990 e os serviços de geolocalização começaram a ser utilizados em meados dos anos 2000.

Atualmente, empresas utilizam ferramentas digitais que registram com exatidão onde o vendedor está, quanto tempo ficou em cada cliente, quando iniciou e terminou o expediente. Esse controle é utilizado para cobrança de metas, elaboração de relatórios de produtividade e até advertências disciplinares. Mas, curiosamente, não é usado para pagar horas extras — o que representa, na prática, um desequilíbrio nas obrigações legais.

A Justiça do Trabalho já tem evoluído: decisões recentes do TST reconhecem que, havendo controle efetivo de jornada — ainda que indireto — o trabalhador faz jus às horas extras, mesmo sendo externo. O critério, segundo a jurisprudência, não é o local de trabalho, mas a possibilidade de controle.

Ignorar isso é manter uma brecha legal que permite o abuso.

É usar a tecnologia para cobrar mais, mas não para remunerar melhor.

- Empresários: manter essa prática é um risco jurídico crescente, que pode gerar condenações trabalhistas e danos à reputação da empresa.

- Profissionais externos: é possível que você esteja deixando de receber valores relevantes — e o Judiciário já tem reconhecido esse direito.

É hora de enfrentar a obsolescência da norma e alinhar a CLT à realidade tecnológica do mercado.



Rodrigo Figueira
Santos e Andrade Sociedade de Advogados
Advogado Trabalhista e Empresarial
(11) 2251-0952
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